O legado arquitectónico de um seixense, Miguel Ventura Terra

Em Seixas, aqui ao lado, a cerca de 2km, exactamente há 150 anos (14 de Julho de 1866) nascia um dos mais notáveis arquitectos portugueses do século XIX e primeiras décadas do século XX, precocemente desaparecido aos 52 anos. Da escola de Belas-Artes do Porto à de Paris, a sua ascensão foi rápida e fulgurante como a de nenhum outro artista.

Miguel Ventura Terra legou-nos uma obra sólida e imaginativa. Um património variado que busca a poesia na consistência formal e na ponderada articulação entre antigas e novas linguagens. Foi mestre na composição equilibrada das componentes básicas de um volume arquitectonico e na depuração das anteriores retóricas ornamentais. Contudo, sem alienar ou depreciar este recurso destinado a insinuar variados efeitos - escultóricos, cromáticos, mitográficos ou históricos - pôde converter uma fachada, uma simples parede ou pilastra, num eloquente painel discursivo a potenciar o poder de comunicação de um edifício.

Com elegância e parcimónia, soube inovar e adoptar novos materiais e tecnologias.E interligar de forma harmoniosa, a pedra, as madeiras, o ferro, o vidro e o azulejo. E sempre com resultados surpreendentes. E assim, por quatro vezes, num curto espaço de tempo, foi galardoado com o prémio Valmor, a principal distinção portuguesa no domínio da arquitectura.

Para múltiplos pontos do país, com predominância para a capital, concebeu um leque diversificado de obras e monumentos. De grande vulto, destinados ao exercício da política, do ensino, da assistência social e médica, da prática religiosa, do lazer e das artes. Como desenhou edifícios destinados à habitação comum e prédios de rendimento. Uns bem cuidados resistindo à usura do tempo. Outros em adiantado estado de degradação ou ruínas e até miseravelmente demolidos. Uma inacreditável situação que nos obriga a reflectir e a agir.

Aqui, junto de nós, na terra que o viu traçar os primeiros riscos e onde mais viva deveria manter-se a memória do artista, e intacto o património que legou aos portugueses, temos um exemplo clamoroso de desleixo. A moradia que o arquitecto seixense construiu para veraneio - na sua limitada dimensão um dos seus trabalhos mais avançados, funcional e esteticamente, rumo à contemporaneidade, encontra-se em lamentável estado  de conservação. Uma casa destelhada, as paredes fissuradas, o travejamento em escombros. Inteiramente à mercê de todas as calamidades e vandalismos.

Um espaço fantasmático. Um destroço a caminho de ruir. Apenas a grande araucária pujantemente verde que lhe faz a guarda deixa no ar um sinal de vida.